Por João Victor Silva, analista de mercado da Orsitec, formado em Relações Internacionais e Economia pela Boston University, nos Estados Unidos.
Após anos de estagnação econômica, 2020 parecia ser o momento em que a economia brasileira começaria a deslanchar. Após a aprovação de reformas importantes como a da previdência, a promulgação da lei de liberdade econômica e o início de um processo de privatizações, as perspectivas dos agentes econômicos sobre o futuro do país eram substancialmente positivas. Contudo, como sabemos, as perspectivas econômicas brasileiras para 2020 não se concretizaram. Afinal de contas, a pandemia de COVID-19 levou à restrição de diversas atividades econômicas, trazendo uma crise econômica sem precedentes não apenas para o Brasil, mas para o mundo todo.
O Brasil, como um país em desenvolvimento e com altos índices de desigualdade social, precisou mobilizar as finanças públicas e o Banco Central para mitigar os efeitos sanitários e econômicos negativos que o vírus trouxe para o país. Assim sendo, o Brasil adotou uma política fiscal e monetária expansionista para minimizar os danos da COVID-19 na economia brasileira. As taxas de juros alcançaram o menor patamar da história (2%) e o déficit primário deve ser superior a R$ 850 bilhões.
Consequentemente, a redução da atividade econômica e a política econômica expansionista causaram diversos desequilíbrios macroeconômicos para o país. O real experimentou uma maxidesvalorização, as contas públicas se aproximam de um patamar insustentável e a política monetária parece estar desalinhada da condição econômica do país. Afinal, os juros reais brasileiros estão inferiores aos de países desenvolvidos como Suíça, Suécia e Dinamarca.
Logo, para manter a situação econômica do país sustentável torna-se necessária a retomada da responsabilidade fiscal para o ano de 2021. No entanto, os agentes econômicos estão temorosos com a possibilidade do “furo” do teto de gastos e a criação de um novo e mais amplo programa social do que o Bolsa Família: o Renda Cidadã.
A realidade é que tanto os agentes econômicos quanto o governo têm razão, pois enquanto a responsabilidade fiscal é fundamental para manter o equilíbrio macroeconômico do país, um programa social que atenda os brasileiros em condição de vulnerabilidade socio-financeira é crítico para manter a estabilidade social do país. Portanto, são necessárias soluções para manter o equilíbrio econômico e social.
A solução não passa pelo “furo” do teto ou por algum tipo de contabilidade criativa, mas de reformas econômicas que priorizem o enxugamento da máquina pública. A reforma administrativa e a reforma tributária serão essenciais para dar maior competitividade ao país e melhorar a eficiência do setor público, enquanto que as privatizações poderão melhorar a condição das contas públicas.
Quando analisamos os gastos públicos, tornam-se ainda mais nítidas as áreas que o governo deve “atacar” para possibilitar uma melhor assistência à população em maior vulnerabilidade social no Brasil e manter a estabilidade social. O jurista Ives Gandra da Silva Martins, em seu livro Uma Breve Teoria do Poder, chama atenção para o fato de que o Bolsa Família, entre 2014 e 2015, que dava assistência a cerca de 13 milhões de famílias, custava em torno de R$ 20 bilhões para o Estado, enquanto o orçamento ultrapassava R$ 1 trilhão. Assim, Ives Gandra conclui que “[r]ecolhemos tributos para sustentar estas máquinas ‘inchadas’, que se multiplicam como ‘ervas daninhas’, e que vivem a criar obrigações para a sociedade e a facilitar a aquisição de benefícios aos ‘amigos do rei’”.
De forma similar, o economista Marcos Mendes destaca no livro Finanças Públicas: Da contabilidade criativa ao resgate da credibilidade que entre 1997 e 2013, o gasto com pessoal do governo federal aumentou 118%. Além disso, o economista ressalta os diversos privilégios que os servidores públicos possuem em relação ao cidadão comum, como a “ampla estabilidade, associada à alta remuneração e as vantagens previdenciárias.”
Outro grande problema das contas públicas são os gastos obrigatórios. Para o orçamento de 2021, são esperados que 95% do orçamento seja comprometido com despesas obrigatórias, reduzindo assim a flexibilidade que o governo e parlamentares possuem de implementar as políticas públicas mais importantes para o país no momento.
Logo, para manter a estabilidade socioeconômica do país, o Governo Federal precisará ter a coragem e a capacidade política de realizar reformas que reduzam os gastos obrigatórios do governo, especialmente com pessoal, e que possibilitem uma maior assistência à população mais vulnerável do país neste momento de incertezas econômicas. Além de essenciais no curto prazo, as readequações dos gastos públicos são importantes para tornar o Brasil um país mais justo e próspero.
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