O novo paradigma comercial dos Estados Unidos e suas implicações para o mundo
O mundo caminha para uma nova ordem política e econômica global. A rápida integração da economia mundial, intensificada entre os anos 1980 e a Crise Financeira de 2008, desencadeou um período de notável expansão econômica.
Por um lado, as nações da Eurásia conseguiram convergir suas economias em direção ao nível de desenvolvimento dos países desenvolvidos. Por outro lado, nas nações desenvolvidas, a prosperidade gerada pela globalização econômica não alcançou todos os segmentos da sociedade.
Nos Estados Unidos, por exemplo, os salários reais das classes média e baixa permaneceram praticamente estagnados desde a década de 1980. Antigos centros industriais entraram em um declínio profundo, afastando o “sonho americano” da realidade do cidadão comum. Foi nesse contexto de desencanto com o sistema político e econômico que Donald Trump surgiu como uma das figuras políticas mais influentes do país.
A guinada na política comercial americana
Desde que assumiu a presidência em janeiro, Donald Trump colocou a agenda comercial no centro de suas prioridades. Inicialmente, voltou sua atenção aos vizinhos, pressionando Canadá e México. Logo depois, expandiu sua política tarifária para o cenário global.
Em 2 de abril, Trump proclamou o “Dia da Libertação”, anunciando tarifas exorbitantes contra diversas nações e estabelecendo um piso mínimo de 10%. Em questão de horas, os Estados Unidos, antes uma das economias mais abertas do mundo, com uma tarifa média efetiva de cerca de 2%, passaram a registrar uma média de aproximadamente 22%.
Contudo, Trump, autoproclamado “Rei da Negociação”, recuou parcialmente de suas medidas uma semana depois, diante da intenção de cerca de 75 países que buscaram negociações com o governo americano. A China, por sua vez, optou por retaliar, levando Trump a intensificar ainda mais o embate ao elevar as tarifas contra o país a impressionantes 145%.
Impactos nos mercados e na economia global
Esse cenário de mudanças constantes na política comercial dos Estados Unidos tem gerado impactos profundos nos mercados de capitais globais, ao mesmo tempo em que acelera a desaceleração da economia mundial. As crescentes incertezas tendem a levar empresas e indivíduos a adotarem uma postura mais cautelosa, postergando investimentos e reduzindo o consumo enquanto tentam antecipar os rumos da economia. Ao mesmo tempo, investidores migram para ativos considerados seguros — como títulos do Tesouro americano, ouro e moedas fortes — numa tentativa de proteger seu patrimônio frente ao aumento da volatilidade.
Reflexos no Brasil
As incertezas econômicas globais já reverberam no Brasil e em outros países. No Brasil, os impactos mais imediatos se manifestam na taxa de câmbio, que se aproxima de R$ 6,00 por dólar. Esse movimento reflete, sobretudo, a queda nos preços das commodities — principal componente da pauta exportadora brasileira — e a fuga de capitais para mercados percebidos como mais seguros.
Além disso, a desaceleração da economia global também deve afetar negativamente o crescimento brasileiro em 2025.
Oportunidades para o Brasil na nova ordem comercial
Apesar dos desafios, a bolsa brasileira tem se destacado com desempenho superior ao dos mercados americano, europeu e asiático. A reestruturação do comércio global cria novas oportunidades estratégicas para o Brasil:
- O país foi agraciado com a tarifa mínima imposta pelos EUA.
- O agronegócio e a mineração podem se beneficiar do aumento da demanda chinesa.
- Os EUA podem ampliar as importações de bens de consumo brasileiros, como calçados e produtos têxteis.
As tarifas e suas consequências para a economia global
O Brasil está entre os poucos países com potencial para colher benefícios na reconfiguração do comércio global. No entanto, para a maioria dos países, o saldo tende a ser desfavorável. As tarifas funcionam, em essência, como um imposto, criando ineficiências no sistema econômico. Para os consumidores, isso significa aumento de preços e possível perda de acesso a produtos de melhor qualidade. Para as empresas, representa menor rentabilidade e maiores desafios competitivos. E para a economia global, um sistema de alocação de recursos menos eficiente, com menor especialização produtiva e perda de escala.
Política externa, desacoplamento e riscos geopolíticos
As barreiras comerciais ganham força impulsionadas pelas demandas da política, tanto no âmbito doméstico quanto internacional. No cenário externo, as tensões entre Estados Unidos e China têm se intensificado. O cientista político americano Graham T. Allison alerta para o risco da chamada “Armadilha de Tucídides”, que descreve a maior probabilidade de conflitos quando uma potência emergente ameaça a hegemonia de uma potência já estabelecida.
Nesse contexto, os Estados Unidos vêm promovendo, desde 2017, um “desacoplamento” econômico em relação à China — política que se manteve sob o governo Biden. Isso está relacionado à crescente dependência americana de insumos provenientes de adversários geopolíticos, um risco estratégico que poderia ser decisivo em um eventual conflito.
A busca pela reindustrialização americana
No cenário doméstico, as barreiras comerciais têm sido vistas como um instrumento para promover a reindustrialização dos Estados Unidos. Contudo, é desafiador imaginar como a economia americana, marcada por altos custos salariais, poderia competir na produção de bens de baixo valor agregado.
Ainda assim, há forte pressão política em regiões industriais como o “Cinturão da Ferrugem” — que inclui cidades como Detroit, Cleveland e Pittsburgh — para revitalizar setores como o automotivo, farmacêutico e siderúrgico. Soma-se a isso a demanda por maior autonomia em áreas estratégicas, como foi evidenciado durante a pandemia, com a escassez de itens básicos de saúde.
Um novo modelo econômico em formação
É cada vez mais evidente que o modelo econômico predominante nas últimas quatro décadas está se esgotando. O novo paradigma, ainda em formação, permanece envolto em incertezas. Os Estados Unidos não têm condições de se transformar em uma economia autárquica, completamente isolada do mundo. O desacoplamento da economia chinesa parece inevitável em meio à crescente rivalidade entre as duas nações.
Parte do fluxo comercial será redirecionada para outros países, permitindo uma produção mais eficiente e de menor custo. Enquanto isso, os Estados Unidos devem concentrar esforços no fortalecimento de setores de alto valor agregado. Essa transição, contudo, será custosa, exigindo adaptações das cadeias globais de valor à nova realidade política. Ainda assim, o caminho parece irreversível, pois as demandas políticas seguem se impondo à lógica puramente econômica.
Conclusão: a nova lógica do comércio internacional
O cenário global está passando por uma profunda reconfiguração, impulsionada por mudanças estruturais na política comercial dos Estados Unidos. O retorno de políticas protecionistas, as tensões com a China e a busca por autonomia estratégica revelam que estamos diante de um novo paradigma econômico e geopolítico, no qual as decisões políticas têm cada vez mais influência sobre os fluxos comerciais e financeiros.
Para os países emergentes, como o Brasil, esse novo contexto representa tanto desafios quanto oportunidades. A habilidade em adaptar-se rapidamente, identificar nichos estratégicos e reposicionar sua pauta exportadora será determinante para capturar os benefícios potenciais dessa transformação. Ao mesmo tempo, é essencial manter a estabilidade macroeconômica e fortalecer setores com vantagens comparativas sustentáveis.
Em um mundo mais volátil e fragmentado, compreender as dinâmicas do comércio internacional deixou de ser uma escolha e passou a ser uma necessidade estratégica. As nações e empresas que conseguirem antecipar tendências, reduzir vulnerabilidades e atuar com agilidade terão mais chances de prosperar na nova ordem global que se desenha.
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